14.11.03

Tinha decidido não tratar mais sobre Priscila aqui. Mas acho que devo esclarecer algumas coisas. Ela tem importância capital na minha vida, assim como eu sei, apesar de tudo, da minha importância na vida dela.
Em primeiro lugar, ela me amou quando eu não me achava digno de ser amado por ninguém. Consequentemente, ela me ajudou a me equilibrar; a tomar rumos; a endireitar caminhos. Ela me ajustou depois de eu ter me desajustado por completo.
Isso é independente das minhas descobertas sobre amor transcendental e amor concreto. Nesse aspecto descobri que minha felicidade nasce em mim e, só a partir daí, serei capaz de pensar em fazer alguém feliz.
Mas isso não significa que removeria o nome de Priscila da lista das pessoas importantes, co-autoras das minhas descobertas libertadoras. Se tenho evitado dizer isso aqui, são outros os motivos. Tenho tratado mais das libertações indiretamente provocadas por ela.
Senti a perda desse amor, ainda que fosse utópico. E o descobri utópico após a perda. Mas agora caminho para estar plenamente aberto a relacionamentos concretos.
Acordo, finalmente, do sonho.

Isso aqui é tocante.

Após um cansantivo dia de edição do Jornal União, recebemos uma ligação informando que o Diário de Natal não tinha papel para rodar o jornal nesse fim de semana. Frustrante. Simplesmente frustrante.

13.11.03

As idéias de transformação revolucionária sempre renascem em mim diante de quadros que aguçam a sensibilidade. Aliás, o tema da vez está sendo sensibilidade.
Como eu gritei por dentro a dor da minha incapacidade quando fui tocado por aquela senhora. Risonha, mas sem dentes, rugas profundas no rosto, peles caídas nos braços, que eram finos como as pernas. Abordando as pessoas no ponto de ônibus pedindo esmolas. Ainda que as tivesse para dar, de nada adiantariam para mudar aquele quadro. O que adiantaria?
Que sociedade doente é essa que lança nas ruas seus cidadãos, especialmente crianças e idosos, sem lhes conferir respeito ou oportunidade? E os jovens sonhando em serem produtivos, mas que até uma escola de qualidade lhes é vetada.
O fermento da indignação explodiu em mim. A certeza de que, tendo as pessoas em primeiro plano, é preciso lutar por transformações.
Quando meus estéticos e sensíveis olhos contemplarem a pobreza feiosa das ruas fedorentas das favelas, devo me lembrar que esse é o retrato do feio monstro do sistema ideológico que quer controlar tudo. É a face de Mamon, a quem o Deus de Amor expulsará.

12.11.03

Não, não é mentira. Tenho sido verdadeiramente capaz de estar feliz comigo. Muito feliz. Não se trata de nenhuma estratégia de auto-engano. Mas é resultado de um processo de auto-descoberta. Processo em que entrei há pouco mais de um ano. Processo que foi de profunda angústia, profunda dor, profundo sofrimento. Processo de desespero da própria vida. Mas as cascas foram sendo removidas; a dor, pedagoga fiel, foi sendo sanada; as feridas aos poucos cicatrizaram; e minha face no espelho ficou mais nítida.
Percebi, então, que fundado em um relacionamento com o Deus Eterno de Amor Revolucionário, somente em mim e de mim brotaria minha chance de ser feliz. Somente assim seria capaz de contribuir para a felicidade das pessoas a quem pertenço. Somente assim valeria a pena. A partir disso, o caminho da restauração de tudo de importante está nos relacionamentos.
Mas saber do meu caminho não é suficiente. Até porque esse foi o meu caminho. Cada um precisa trilhar o seu próprio. O que posso dizer é que vai doer, é arriscado, você vai perder muita coisa que julga importante e vai descobrir que nem é tanto (ainda que não saiba o quê).
Curta o que doer. Viva o que vier. Ao fim de tudo, terá valido.

11.11.03

Meu olhar cruzou o dela. Vi tristeza, dor, sofrimento. Vi peso. Angústia. Ela entrava em Natal, ônibus vindo do interior do estado. Nos seus olhos era capaz de ver a sua história. Filhos que nunca tiveram acesso ao que ela sonhou poder dar. Trabalho, canseira, enfado em um casamento que se mantinha como gerador de força e unidade, mas que não conhecia afeto, amor profundo. Relacionamentos partidos. A falta do toque e da mão de amparo. A dor da falta das oportunidades de felicidade e de trabalho.
Nossos olhares se cruzaram mais uma vez. Vi alegria. A alegria de chegar em sua expressão sofrida. Vi uma mulher. Preocupava-se em ajeitar o cabelo, passar batom, se embelezar. Quem a esperava na rodoviária? Quem seria? Para quem ela vinha? O que sua vinda à capital lhe reservava?
Mais que isso: quem ela esperou toda a vida? Que felicidade ela sonhou? Que sonhos não foram realizados? Que partes de sua vida foram quebradas e jamais coladas de novo? Que amores ela viveu? Que amores perdeu?
Nunca um par de olhos me falou tanto. Nunca olhos me significaram tanto. Nunca olhos me instigaram tanto a sensibilidade.
Olhos estranhos me falaram mais do que olhos amigos. Por quê?

Dia desses uma amiga me confidenciou que estava mal há algum tempo. Mas ninguém percebia. Ninguém prestava atenção.
Perdemos tanto de nossa sensibilidade que somos incapazes de ver a dor e o sofrimento de quem caminha a nosso lado? Será possível reverter isso?

Assisti ontem Reloaded (de novo) e os Animatrix. Preparativos para ver Revolutions.
Entendi, finalmente, o diálogo entre o Arquiteto e Neo. E percebi que o Animatrix O segundo renascer, em especial a primeira parte, mantém o nível do filme original, em termos de densidade. Nível perdido nas continuações, comerciais demais. Isso apesar da obviedade de algumas alusões.

9.11.03

Amar, ser feliz, ser gente, se relacionar é perigoso. É custoso. É arriscado. Mas vale a pena. Vale a dor. Vale o risco. Amar e se entregar por inteiro, a quem quer que seja: isso me faz mais gente e mais feliz. Acredite. É possível. É melhor.

Ontem, participei aqui em Natal do I Encontro de Políticos Evangélicos, cobrindo para o Jornal União.
Presenças de diversos políticos. Os mais famosos, o casal Garotinho. Algumas afirmações interessantes. Algumas idéias questionáveis.
Garotinho defendeu que o mundo somente pode ser transformado a partir da mudança individual. É preciso que o homem mude seu coração para que a sociedade se transforme. Permito-me discordar dele.
Acredito que, como Igreja, precisamos adotar uma visão holística que abranja ambos os aspectos, que creia nas duas coisas. Que abrace as duas idéias.
Acredito que as mudanças sociais devem ser objeto de nossa luta constante como Igreja. A busca por justiça social, por eqüidade, por revolução. Isso acontece a partir da interação ativa entre os sujeitos dessa sociedade. Firma-se, em outras palavras, em relacionamentos.
São os relacionamentos que transformam os corações dos homens. E a partir da interação relacional entre esses mesmos homens, o objetivo de revolucionar a estrutura, demoníaca, da sociedade pode ser atingido.
Enfim, as duas coisas devem andar lado a lado. Lutamos por mudanças sociais porque cremos no Deus Eterno de Amor. Lutamos por intimidade nos relacionamentos porque cremos que o amor vale a pena todos os riscos. As pessoas são o fóco principal de cada mudança. O amor às pessoas são o motivo de nossas lutas. Lutas para mudarmos a nós mesmos e mudarmos o mundo em que vivemos, sem desistir.
As pessoas devem estar na frente, no entanto, de nossas idéias. Só então nossas idéias, nossas revoluções, terão sentido. Fui claro?

Recomendo:
Nós que aqui estamos por vós esperamos.
Certamente, após ver esse filme você será uma pessoa mais sensível.