O que aconteceu com o garoto João Ricardo é uma tragédia anunciada. Aliás, anunciada não só, como também repetida. Isso acontece todos os dias na maior parte do país: a polícia executa seus alvos sem chance de defesa. Ano passado eu conversei com uma amiga que defendia que "bandido tem que ser morto mesmo". Apesar de ela ser evangélica. E eu argumentava o que para mim é óbvio. Por mais que a sociedade captule e aceite essa polícia violenta e assassina porque sente que sua insegurança é enfrentada pela morte dos criminosos, ela ainda ia sentir na pele a conseqüência. E minha amiga só ia perceber quando tarde demais fosse. Primeiro, uma polícia violenta e assassina, como a denunciada por Tropa de Elite (que não foi compreendido pelo público, que transformou em herói quem era tão bandido quanto os traficantes), é um risco à democracia e ao Estado Democrático de Direito. A democracia e a sociedade sofrem séria ameaça se algum ente dessa relação percebe ou recebe poder absoluto. Para definir quem vive e quem morre. À margem da lei. Mesmo aceita pela classe média - que é quem menos sofre as conseqüências de suas ações - a polícia que mata, espanca e tortura é tão ou mais marginal que os bandidos. Os bandidos já são declaradamente fora da lei - sua ação ilegal não surpreende nem é novidade. Mas quando a gente permite que nossas polícias sejam fora da Lei - aí o perigo e o problema residem e imperam com força. Mas eu dizia à minha amiga que ela só perceberia a ignorância de sua defesa da violência policial quando cada vez mais inocentes fossem mortos pela polícia. Não que eles não tenham sido sempre mortos - e transformados em vilões, traficantes, pelo relato inconteste dos agentes da lei. Mas quando a história fosse inverossímel, ela se lembraria de mim. Em pouco tempo, seis jovens negros e sem nenhuma passagem policial ou envolvimento em crimes, foram executados na Bahia. Um estava no carro da patroa, acompanhado por ela, colocando créditos no celular, quando foi executado por uma policial à paisana que acreditava que o negro em uma mercedes só podia ser assaltante! Outro, era um artista circense que trabalhava em Belo Horizonte e estava visitando a família na Bahia. Uns meses atrás, um vocalista de uma banda gospel, de igreja, foi executado pela polícia no Rio, que plantou em suas mãos arma e drogas. E tudo culmina com um garoto morto da forma como a polícia sabe agir e é instruída para fazer. Atirar para matar. Depois, se inventa que havia um tiroteio. Era capaz de dizer que João Roberto, aos três anos, empunhava uma arma. Mas dessa vez foi diferente. A mentira foi pega, porque alcançou uma família de classe média. Mas nas periferias, com gente sem instrução, o que não acontece? Espero que não vivamos um tempo como o de anos atrás em que, por escrever um livro sobre a Rota, Caco Barcellos se viu obrigado a ir morar no exterior. Espero que nossa sociedade acorde para isso e não se permita mais ter uma polícia de Nascimentos.
Estou de férias em Natal e ontem fui assistir ao jogo do ABC contra o Ceará. Foi um belo e emocionante jogo. No fim, um justo 3 a 3. Mas que podia ser 4 a 4, 5 a 5 ou ter a vitória de qualquer um dos dois. O ABC iniciou o jogo melhor, dando mostras que poderia, até, golear. Mas perdeu muitos gols. Ainda no comecinho do jogo, o goleiro Marcelo Bonan, do Ceará, matou um contra-ataque do ABC pegando a bola com as mãos fora da área. Com isso, foi expulso. Papel abriu o marcador de cabeça. Fazia três meses que não marcava um gol. O time relaxou e permitiu que, antes do fim do primeiro tempo, o Ceará empatasse. Insatisfeito com o empate, Ferdinando Teixeira ousou. Tirou um zagueiro (Fabiano) e pôs Ivan. Levou, com isso, um duplo azar. Primeiro, Ivan jogou muito mal, com muita lentidão. Depois, um dos dois volantes foi expulso (Jean). A marcação, que já estava deficiente pelo meio no primeiro tempo, caiu em frangalhos. Com isso, em questão de três minutos, o Ceará virou e abriu 3 a 1. Sempre pelo meio. O terceiro gol teve a colaboração de Valdir Papel que, ajudando o lado esquerdo da defesa, saiu jogando errado e entregou a bola nos pés do ataque do Ceará. Quando pareceu que tudo estava perdido e parte da torcida ao meu lado se levantava para ir embora, Alexandre - bom jogador - ganhou um penalti. Ainda eram 17 minutos do segundo tempo quando Papel bateu e fez o segundo dele e do ABC no jogo. Aí o jogo perdeu em tática. E ganhou em emoção. Lá e cá. O meio de campo dos dois times não marcava nem mais bilhete de loteria. Aí Ferdinando fez um alteração dupla da qual eu discordei. Tirou Rodriguinho para colocar Jean Carioca, e tirou Bosco para colocar o volante Marcelinho. O time perdeu força pela direita - sem Bosco, que ainda quis voar num torcedor que, da arquibancada gritou que era preciso ter preparo físico para jogar pelo Mais Querido. O time se desmantelou de vez, apesar de Jean e Marcelinho terem ido bem no jogo. Só que não havia mais uma arrumação tática convincente no time. E o pobre do Alisson, pela esquerda, ficou sobrecarregado. Em um dos raros lances pela direita, um cruzamente alcançou a cabeça de Valdir Papel que marcou seu terceiro gol no jogo. Um gol por cada mês que ficou sem marcar. Depois disso, o jogo ficou ainda mais aberto. O Ceará perdeu um gol incrível com Ciel, que driblou todo mundo, até Paulo Musse, e chutou na trave. Em seguida, Jean brigou pela bola na direita, na linha de fundo (bem em frente de onde eu estava), olhou para cruzar (por que não bateu no gol!) e fez o cruzamento rasteiro para Marcelinho no meio da pequena área. O goleiro Gustavo tentou tirar a bola, falhou e a jogou para dentro do gol. O zagueiro cortou, não que sem antes toda a torcida do ABC gritasse gol, inclusive eu. Mas a bola não entrou. Por que Marcelinho não deu um carrinho naquela bola? Fim de jogo. De um jogão. 3 a 3. Terça-feira vou acompanhar o jogo contra o Bahia pela tevê. Na semana que vem, o time pega o América. Uma pena que vou estar no Chile. Uma pena? Uma pena nada! Eu vou é curtir minhas férias lá em Santiago.