28.2.03

O futuro não é de muita esperança. Especialmente quando tem seus destinos comandados por um homem como George W. Bush. Fiquei ainda mais decepcionado quanto li hoje um texto que o jornal em que trabalho vai publicar semana que vem, como matéria paga.
Nele, um pastor defende a política externa norte-americana como defesa da justiça e liberdade mundiais. Diz que se a ONU não atacar o Iraque estará sendo conivente com a morte de milhões de inocentes (!). Que George Bush é o baluarte da paz mundial. Além de desprezar as manifestações pela paz em todo o mundo, como partindo de algumas poucas pessoas (em Londres, a manifestação reuniu um milhão de pessoas: a maior manifestação pacifista da história britânica, no país que é o principal aliado de Bush). Subiu uma indignação quase incontrolável com a parcialidade ideológica do texto. Partiu meu coração.
Acredito que nenhum desses pacifistas é cego quanto às atrocidades da ditadura de Saddam. Mas ninguém acha que o maior império da terra é inocente e justo. E sabe que sua ação vai causar a morte de muitos inocentes e arrasar um país já arrasado. Na Guerra do Golfo, 150 mil civis iraquianos foram mortos pelas tropas de Bush Pai. Será que se pode defender uma ação assim como cristã? Ou defender a morte, até hoje, de milhares de crianças iraquianas, por causa das sanções impostas pelos ianques?
Por que será que os americanos não se questionam seriamente pelo fato de serem a nação mais odiada do mundo?
Tenho pouca esperança hoje. Espero que os cristãos brasileiros que vão se reunir para orar e meditar diante de Deus nos próximos dias possam, dessa maneira, mover a história para que seja diferente. De outra forma, a dor e a iniquidade tenderão a se multiplicar ainda mais.
Até a próxima quinta-feira!

27.2.03

O principal marco teológico do século XX foi a publicação do Comentário a Romanos, do suíço Karl Barth, logo após o fim da Primeira Guerra Mundial.
A teologia do momento, liberal, afirmava com todas as forças a capacidade humana e a crença no progresso. A crueza e tragédia da Guerra puseram fim a essa ilusão. O homem é mal, o progresso não é necessariamente bênção, a sociedade é capaz de se auto-destruir.
Com a obra de Barth nasceu a teologia dialética ou neo-ortodoxa. Sem desprezar os avanços do liberalismo teológico, propugnou a volta à centralidade da Palavra de Deus, esvaziada pelos liberais. O Comentário a Romanos se inscreve nesse horizonte.
Para Barth, no entanto, a Palavra de Deus não se confunde com a Bíblia, mas é maior que ela. Ordinariamente, porém, Deus usa a Bíblia, especialmente quando pregada, para falar a Sua Palavra.
Barth não casou com o fundamentalismo, resposta pouco inteligente ao problema do liberalismo teológico.

Ano passado, fiz uma exegese em Romanos 13, procurando uma resposta à pergunta pelo lugar da desobediência na vida cristã.
Fui até o Comentário a Romanos e me decepcionei com Barth. Ali ele afirma que não lugar para a Revolução na perspectiva cristã.
Mas Barth não estava morto. Suas perspectivas mudaram, especialmente quando surgiu o nazismo na Alemanha (onde estava radicado). Quando a Igreja Alemã, em peso, se aliou a Hitler, Barth, Brunner, Bonhoeffer e muitos outros, a partir da Confissão de Barmen, se uniram no movimento conhecido como Igreja Confessante, resistindo ao regime do III Reich. Bonhoeffer foi morto em 1945 em um campo de concentração, acusado de participação em um plano para assassinar Hitler.
E a perspectiva barthiana mudou tanto, que ele é citado por Waldo César, conforme Joanildo Albuquerque Burity:
[A esperança que Cristo nos deu é] a esperança mais revolucionária que se pode conceber, ao lado da qual todas as outras revoluções não são mais do que miseráveis foguetinhos.
Waldo César responde que revolução é essa:
Trata-se da mudança das estruturas arcaicas e iníquas em que vive o nosso povo. Nós [a igreja] deveríamos andar na vanguarda dos movimentos de renovação. Temos todos os elementos para isto.

Priscila, a ciumenta, já está no paraíso. E hoje é dia de tirar o atraso e beijar muito.

O Kibe loco! mandou bem nessa charge sobre o Latrocínio de Bush.

26.2.03

Ontem eu ouvi na rua alguns senhores conversando. E um deles já vaticinava que Lula não ganharia mais nem uma eleição para síndico de prédio, pela decepção que tem causado aos seus 53 milhões de eleitores.
É óbvio que isso é uma precipitação sem tamanho. Dois meses de governo não podem determinar o futuro político de ninguém. Mas não deixo de estar preocupado.
Ano passado, uma onda vermelha de esperança invadiu o Brasil. Muitos votaram em Lula pelo clima de otimismo que movia sua campanha. Muitos sabiam que algo precisava mudar, mas eram incapazes de saber exatamente o quê.
Eu não gostaria de me incluir nesse grupo. Desde 1989, sou lulista de carteirinha. Meu pai ajudou a fundar o PT, e, mesmo que não tivéssemos a convivência que eu gostaria, isso marcou profundamente politicamente. Eu acreditei, acredito e sempre acreditarei no PT.
Mas estou preocupado. Não votei em Lula sem saber o que precisava mudar. Também acho que a mudança não pode ser radical. Porque romper com o estabelecido para cair no vazio iria ser um desastre total. Mas me preocupa que a ortodoxia econômica do governo não se afasta um passo do neoliberalismo e o governo não parece conhecer alternativas (a não ser a volta do planejamento desenvolvimentista da Cepal dos anos 50 e 60).
Aumento de juros, manutenção de política monitarista e corte de gastos públicos em áreas sociais para equilíbrio de contas são premissas neoliberais, desde Pinochet, Thatcher e Reagan. E foram os passos que a atual ekipeconômica gerou.
Acho que ainda é muito cedo. Há tempo para mudarmos o modelo nesse governo. Não sei, porém, se haverá tempo para que as vítimas excluídas desse modelo idolátrico sobrevivam. Se Deus e o Fome Zero ajudar. E se Lula não se constituir no maior estelionatário da história do Brasil, como falava o Vampiro Brasileiro, Serra.
Mas eu ainda creio em Lula, no PT e na mudança. Ainda sou lulista de carteirinha. Ainda acredito que o PT poderá ser o agente da revolução social preconizada por José Dirceu na cerimônia de sua posse.
Que o Deus da revolução nos ajude.

O Flávio já iniciou seus posts no Porto Seguro. Seja bem-vindo.

A guerra de Bush foi bem tratada hoje por Leão Serva. Em busca de um motivo para a guerra, que você encontra aqui ou aqui.

25.2.03

A RESPOSTA CRISTÃ À MORTE

A resposta cristã à morte nasceu em um contexto revolucionário, o que significa que a fé na ressurreição é intimamente relacionada à fé na revolução. Além disso, a fé na ressurreição de Cristo (e na nossa própria, acompanhando-O) revoluciona nossa vida no íntimo.

A fé na ressurreição nasceu no período macabeu da história judaica, período de muitos martírios por parte dos helenistas contra os judeus fiéis. Período também de intensa fé no Deus revolucionário que poria fim à abominação inigualável de Antíoco IV Epífanes, que chegou a profanar o templo, colocando lá dentro uma estátua do Zeus Olímpico.

Nesse contexto, no qual são escritos os livros de Macabeus e o livro de Daniel, a revolução movida pela fé no Deus vivo é vencedora. Os macabeus conseguem reconquistar a autonomia e a fé de sua terra. Não sem antes, muitos judeus serem mortos em nome de sua fé.
É assim que surge a fé na ressurreição, pela primeira vez no livro de Daniel. Os judeus estão dizendo aos seus opressores e assassinos:
Vocês podem nos afligir e até nos matar, mas jamais poderão pôr fim à nossa vida.

Daniel e Apocalipse (a literatura apocalíptica) são livros de revolução. São a literatura de resistência, literatura subversiva, que denuncia os impérios e anuncia todo o juízo de Deus sobre os opressores. A mensagem é clara: Deus, o Deus das revoluções, intervém a fim de acabar com a opressão.

Paulo, herdeiro da tradição farisaica (logo, também dessa tradição apocalíptica) nos diz com enorme beleza e sensibilidade, que se Cristo não ressuscitou, não há ressurreição e vã é a nossa fé e a nossa pregação, e somos os mais infelizes dos homens, porque a nossa esperança em Deus se resume a essa vida.
Mas ele sabe que isso não é verdade: Cristo ressuscitou. Assim, estaremos um dia libertos da morte e ressuscitaremos com Ele.

A fé na ressurreição nos liberta de qualquer amarra nesse mundo e a esse mundo. Não precisamos temer nada, ninguém, nem mesmo a morte. Podemos nos entregar totalmente ao compromisso de discipulado com Deus. Podemos deixar de lado todo comprometimento humano: nosso único compromisso é com o nosso Deus, sem medo ou censura.
Não temeremos ameaças, constrangimentos, impedimentos, opressões, morte, porque nada disso pode nos roubar aquilo que já temos com o Senhor. Somos livres para qualquer coisa em Seu nome, para Aquele, Único que pode fazer perecer completamente o homem.
Em suma, a ressurreição nos fortalece rumo à revolução.

Em tempo: Meu tio morreu. Mas sei que um dia ele ressuscitará.

SOBRE AMBIÇÃO DE PODER

Outro dia, ouvi duas pessoas conversando sobre a prática do jejum. Um deles dizia que sua necessidade de jejuar era ter poder, poder como o que Moisés manifestou para abrir o mar.
Sempre temi o jejum devido às suas possíveis motivações erradas. E eis uma delas.


Em primeiro lugar, essa motivação representa uma tentativa de comprar o favor de Deus. Mas Deus não se dobra; essa idéia é perda de tempo.
Imagina-se, muitas vezes, que a quantidade de jejum que se oferece a Deus garante-lhe o corresponde o equivalente em bênçãos. E mais que isso: PODER.

Aí está o mais grave. Jejua-se movido por uma egoísta ambição de poder. O mesmo mecanismo que tantas vezes move o mundo é reproduzido firmado na forma da ambição pelo poder.
Mas uma vez percebe-se o conteúdo ideológico de uma visão religiosa. Uma ambição pecaminosa. O poder espiritual, segundo essa concepção, não deixa de ser uma nova versão, a transposição, do poder segundo o mundo.

O Deus das revoluções não é assim. A vida de Jesus, o Messias, foi sempre marcada pela negação a qualquer forma mundana de ambição pelo poder. Recusou propostas que igualariam sua obra a de qualquer governante.

O poder espiritual deve ser distinguido, contra a ideologia, das formas mundanas de poder. Essa deve ser uma tarefa da utopia.
O poder espiritual é o poder da cruz, da morte, do esvaziamento que trazem vida.

A maior vitória do universo foi a cruz. Nela Jesus venceu. Ele venceu na sua derrota, na sua fraqueza.
Por isso, disse a Paulo que Seu poder se aperfeiçoa na fraqueza.

E por que jejuar? Simplesmente porque é uma forma de comunhão com o Incondicionado, com o Deus vivo.
Jejuamos porque amamos e necessitamos da presença de Deus e o jejum é capaz de estreitar nossa relação com o Pai.

Em nome da sensibilidade

Existem pessoas com grande poder financeiro e material. Geralmente esse poder é inversamente proporcional à sua capacidade de ser humano. São pessoas que até detém grande influência, mas são incapazes de marcar profundamente a sua vida.
Existem pessoas com grandeza intelectual e cultural. Essa grandeza pode ou nos manobrar, ou nos orientar. São pessoas que causam em nós admiração, podemos até seguir sua orientação. Deixam rastros em nossa vida.
Mas há pessoas especiais. De profundidade e grande sensibilidade. Seu maior poder reside na capacidade de serem sensíveis. A vida não passa, simplesmente, por elas. São pessoas que vivem, verdadeiramente, suas vidas.
É gente que nos move, nos comove, nos seduz e nos marca com profunda verdade. Gente que nos transforma quando nos deparamos com seu jeito sensível.
Gente de quem o mundo precisa. Gente como Alice.

Senhor dos Ventos, tentei deixar uma mensagem de agradecimento no seu blog, mas não consegui. Obrigado pelo seu carinho e sentimentos.

24.2.03

Primeiro, uma viagem de trabalho no fim de semana.
Agora, o falecimento de meu tio-avô.
Dessa forma, meus posts estão suspensos até, pelo menos, a quarta-feira.