Ainda sobre a minha avó. Mas é claro que minha avó carrega muitas feridas. E eu disse a ela que suas feridas foram provocadas porque, ao longo de seus 81 anos de vida, ela foi incapaz de resolver seus problemas.
Minha avó é altamente explosiva. Ao se irritar, ela expõe logo tudo o que pensa. No entanto, ela nunca conseguiu voltar atrás para tratar suas dificuldades, seus problemas. Ela carrega suas feridas sem permitir que cicatrizem. Que sejam curadas. Ela se revela incapaz de buscar alguém e travar uma conversa cujo tema seja perdão e reconciliação.
Por isso, a depressão. Por isso, a morte como ambiência de vida. Por isso, uma vida que, na melhor das hipóteses, se resume à sua relação com a filha, que ultimamente não tem lhe dado atenção.
Disse à minha avó que não quero repetir a sua história. Quero ser capaz de voltar e de resolver meus problemas relacionais. Quero focar o que de valor tenha em minha vida nos meus relacionamentos, nas pessoas à minha volta. Quero que elas sejam importantes e, assim, quando com elas tiver problemas, possa, ainda que doa, resolvê-los. Quero viver de maneira plenamente humana a plenitude de vida que o amor e as pessoas trazem. Quero, de verdade, viver.
Porque eu não quero carregar chagas do passado (posso permitir que elas cicatrizem) e porque não quero reproduzir as mesmas feridas no futuro busco resoluções e busco curas que para minha avó são incompreensíveis. Ela, que se acostumou a engolir suas mágoas, não compreende porque eu não as suporto em mim e busco o diálogo com pessoas as mais diversas para resolvê-las, curá-las, tratá-las, cicatrizá-las.
Não quero repetir minha avó. Quero chegar à velhice pleno de vida, pleno de paz, pleno de amor. Sem o peso das feridas do passado, mas com cicatrizes que me mostrem a experiência que acumulei ao errar.
Quero viver o meu amor.
4.11.03
Espaço para minhas reflexões e loucuras, existenciais, acadêmicas, teologicas e emocionais
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