20.5.05

Consciência e realidade

Consciência e realidade

 

Senhor, afaste-se de mim, pois eu sou um pecador!

Lucas 5. 8.

 

Sujeito assujeitado é um termo de uma disciplina chamada Análise do Discurso, aparecendo também em outras perspectivas que fazem o estudo da Ideologia.  Significa o indíviduo que, inconsciente de viver imerso em uma estrutura ideológica, torna-se inconsciente também de que sua fala e seu discurso não passam de meras reproduções de formações discursivas ideológicas.  Mais que isso: sua própria forma de viver e ver o mundo é estruturada tendo por fundamento a ideologia na qual ele se insere.  A pior parte de se ser um sujeito assujeitado é a ilusão que cria a ideologia de que aquilo que você diz é produção sua, quando, na verdade, você está ?sendo falado? por outras vozes.  Quer dizer, por mais que você ache que seu modo de ver o mundo e suas falas sejam originais [só você pensa como você], não deixam de ser aquilo que uma ideologia quer que você pense e fale.  Você é apenas uma espécie de papagaio.

Todos nós somos assujeitados a alguma concepção ideológica.  Porque todos nós vivemos em um mundo imerso em ideologias.  A diferença que pode haver entre nós é o nível de consciência que teremos.  Podemos ser mais ou menos conscientes da ideologia e do mundo em que vivemos.  É aqui que reside a grande diferença: podemos ter consciência da nossa realidade.  Ou não.  Podemos sair do nível ingênuo, ou nos perpetuarmos no assujeitamento ideológico.

Mais uma vez vou pedir perdão por citar um filme.  O 13º Andar é uma ficção científica de primeira que nos fala, entre muitas coisas, acerca da tomada de consciência a respeito da realidade.  No início somos transportados para uma cidade americana dos anos 30 [Chicago, se não me engano].  Logo descobrimos que essa cidade não existe em mundo concreto.  Ela é uma simulação de computador, inclusive seus habitantes.  No entanto, uma interface permite que os cientistas entrem na simulação e interajam com os programas inteligentes.  Aliás, esses programas são ?avatares? [me permitam, pois é o termo usual] de personalidades do mundo concreto.  Assim, quando fazem a interface, as pessoas assumem os papéis de seus avatares no mundo simulado.

Nenhum dos programas é consciente.  Eles não têm nem consciência suficiente para se questionar porque seu mundo é tão pequeno: eles nunca saem da cidade porque o fim da cidade é o fim do seu mundo, literalmente.  É onde acaba a simulação.  Mas eles não sabem disso.  Foram apenas programados assim.  Tudo mudaria, se eles tomassem consciência desse fato.  Eles vivem em um mundo limitado, inconscientemente.

O filme, a partir do assassinato de um dos cientistas do projeto, narra como se dá uma tomada de consciência a respeito do mundo real.  E mostra que a profundidade de nossa percepção da realidade concreta é diretamente proporcional ao tamanho da consciência que nós temos de nós mesmos e deste mundo.  Em outras palavras, o filme me inspira a entender que quando mais conscientes somos a nosso respeito e a respeito da realidade do mundo, mais conseguimos nos libertar do assujeitamento.  Quando mais somos conscientes, mais entendemos o mundo, mais alargamos nossa visão da realidade.  O tamanho da nossa realidade, ou sua profundidade, é diretamente proporcional à nossa consciência.  A realidade, assim, se assemelharia às camadas de uma cebola.  Quando mais profunda é nossa consciência, mais profunda se torna nossa percepção da realidade, como se passemos de uma camada exterior para uma mais profunda da cebola.

É claro que você deve estar se perguntando o que isso tem a ver com o texto de Lucas.  O momento citado no capítulo 5 de Lucas é o momento que manifesta a tomada de consciência de Pedro.  Ele se conscientiza acerca de quem ele é e de quem é Jesus.  É o primeiro passo para largar o assujeitamento em que vive e passar a ver o mundo real de maneira mais profunda, a partir do ponto vista concedido por Deus.  Após contemplar a maravilhosa pesca, fruto do milagre de Jesus, Pedro se toca que Aquele que está ali é puramente Santo e Todo-Poderoso.  E, percebendo isso, percebe o seu próprio pecado e sua incapacidade em permanecer na presença dEle.  É preciso fugir, já que Deus é santo e eu sou pecador.

Mas essa tomada de consciência, como dizia, é o primeiro passo para aprofundar nossa visão de mundo.  A partir daí, podemos ir mais fundo.  Podemos mergulhar em uma relação de cada vez mais intimidade com Deus e, a partir disso, mais conscientes de nós mesmos e do Senhor, podemos largar o assujeitamento.  O mundo, que jaz no maligno, nos quer cegos e assujeitados.  Podemos, no entanto, olhar para o mundo de outra forma.  E isso acontece dentro de um processo de tomada de consciência, que nos mostra a realidade de maneira mais profunda.  Além de vermos mais longe [o mundo não precisa ser limitado], vemos mais fundo.  Vemos a realidade mais profunda de maneira mais absoluta.  Vemos a totalidade, porque vemos do ponto de vista de Deus.  Quando mais íntimos do Senhor nos colocamos, mais libertos de uma visão e consciência limitada de mundo estaremos.  Mais libertos de uma consciência limitada acerca de nós mesmos.  Mais experimentaremos a profundidade da realidade total em que nos encontramos.  Descobriremos, assim, que existem mais mistérios entre os céus e a terra do que podem sonhar todos os filósofos, como diria Shakespeare.

Mergulhe de cabeça em uma relação de Deus.  Quando mais próximo dEle, mais consciente de si e do mundo.  Maior seu mundo, mais profunda sua visão.  Maior sua percepção e experiência da realidade da vida.  A intimidade do Senhor é o desejo que Ele tem para nossas próprias vidas.  Porque Ele veio nos libertar, e se Ele nos libertar seremos verdadeiramente livres.

 

Daniel Dantas

Missionário da 1ª IPI do Natal

http://cavernadeadulao.blogspot.com

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