26.1.03

O livro bíblico mais revolucionário para mim é o evangelho de Lucas. Ali você vai encontrar preciosidades que demonstram o nosso imenso pecado contra o Deus das revoluções. Alguns exemplos:
“Bem-aventurados vocês, os pobres, pois a vocês pertence o Reino de Deus.
Bem-aventurados vocês, os que agora têm fome, pois serão satisfeitos.
Bem-aventurados vocês, que agora choram, pois haverão de rir. (...)
Mas ai de vocês, os ricos, pois já receberam sua consolação.
Ai de vocês, que agora têm fartura, porque passarão fome.
Ai de vocês, que agora riem, pois haverão de se lamentar e chorar”. (Lc. 6. 20 – 21 e 24 – 25).
Mateus espiritualizou tudo, mas Lucas conserva a crueza e dureza o discurso de Jesus, que se complementa mais à frente, no seu encontro com o jovem rico, quando o Mestre diz: “Como é difícil aos ricos entrar no Reino de Deus! De fato, é mais fácil passar um camelo pelo fundo de uma agulha do que um rico entrar no Reino de Deus”. (Lc. 18. 24 – 25). E essa fala de Jesus é ilustrada no capítulo seguinte no relato da conversão do rico e ladrão (o que é praticamente óbvio – todos os ricos enriquecem porque exploram alguém, sua força de trabalho, sua personalidade, seus bens) Zaqueu. Zaqueu se converte. Mas qual é a prova de sua conversão? “Olha, Senhor! Estou dando a metade dos meus bens aos pobres; e se de alguém extorqui alguma coisa, devolverei quatro vezes mais. Jesus lhe disse: Hoje houve salvação nesta casa!” (Lc. 19. 8 – 9). Só se sabe que Zaqueu se converteu porque ele partilhou a sua riqueza.
Preste atenção na conta. Se Zaqueu possuísse o equivalente a 100 “dinheiros” e deu metade aos pobres, lhe restou 50, não é verdade? Pois bem, Zaqueu era chefe dos coletores de impostos, sabidamente uma profissão que extorquia a população. Eles, de antemão, pagavam os impostos aos romanos do próprio bolso. Aí, ficavam livres para lucrar o quanto quisessem, ao cobrarem a dívida de seus conterrâneos. Para que Zaqueu não ficasse devendo ao final do pagamento de suas “dívidas”, a parcela de dinheiro que equivaleria ao que ele recolheu de lucro sobre os impostos não poderia ser maior que 12, 5 dinheiros, o que é historicamente improvável. Ele era o chefe, logo auferia lucros muito maiores que esse percentual. Entendeu? Zaqueu, ao se converter, de rico se tornou pobre. Para o rico se converter, na concepção de Lucas, ele deve se tornar pobre!
O que a gente faz então? Manda os ricos de nossas igrejas se converterem. De verdade. Apesar de entendermos que isso é virtualmente impossível.
Mas acredito que esse pecado é motivo de nossas igrejas serem irrelevantes na nação. Por isso é que eu acho que o que diz Arnaldo Antunes, se aplica perfeitamente ao nosso trabalho como igreja, atualmente. Essas perguntas deveriam ecoar nos nossos templos, para percebermos que a nossa falta de compromisso com o Deus da Palavra é que nos distancia do povo a quem somos enviados e nos faz sermos pouco entendidos:
“Será que eu falei o que ninguém ouvia?
Será que eu escutei o que ninguém dizia?”

Acredito que a resposta, no caso da igreja, é sim. Nosso discurso não combina com nossa prática e ambos estão distantes das necessidades do povo, porque nos distanciamos do Deus que nos chamou. Nosso compromisso tem sido com Mamon e seu status quo. Enquanto isso, nenhuma diferença social faremos. Manteremos a ordem (porque criar desordem é do diabo, dirão), temeremos qualquer revolução.
Mas eu vou ficar com o que ainda diz Arnaldo Antunes, respondendo suas perguntas:
“Não vou me adaptar!!!”

0 Comentários:

Postar um comentário

Assinar Postar comentários [Atom]

<< Página inicial